Sumário de culpa ex officio realizado na vila de Lages, na época sob a comarca de São José.
Partes do processo:
A Justiça (autora);
Francisco (réu; recorrido; escravizado);
Salvador (réu; recorrido; escravizado);
Felisberto Caldeira de Andrade (ofendido);
Hermogenes de Miranda Ferreira Souto (ofendido);
Francisco Honorato Cidade (recorrente).
Resumo:
Neste processo, a Justiça moveu um sumário de culpa contra os réus Francisco e Salvador. Francisco era escravizado pelo alemão Antonio de tal, e Salvador era escravizado por Antonio de Carvalho Bueno.
O fato criminoso foi um arrombamento, cometido na casa do doutor Hermogenes de Miranda Ferreira Souto e seu cunhado, o negociante Felisberto Caldeira de Andrade; em seguida, foram roubados 195.200 réis (195$200) do doutor Hermogenes.
Foi, então, feito um exame de corpo de delito na casa de Hermogenes, onde foi observada a cena do crime. Os peritos julgaram que a porta da varanda da casa foi arrombada com o uso de uma trincha ou formão de pedreiro, usada para estourar a tranca da porta.
O doutor Hermogenes e Felisberto moravam na mesma residência. O Hermogenes informou que, na noite anterior ao fato criminoso , foi convidado a assistir a um baile na casa do major Antonio Benedicto dos Santos. Porém, ao retornar para sua casa, em torno das 3 horas da madrugada, encontrou sua casa dilapidada pelo arrombamento. O ofendido deu falta de uma bolsa, que continha 15 moedas de ouro, cada uma valendo 10.000 réis (10$000); e também uma carteira que continha duas moedas de ouro, cada uma valendo 20.000 réis (20$000). Baús também foram encontrados escancarados, e dois anelões de ouro (um verdadeiro e outro falso) que nele estavam foram roubados. Até esse momento, não havia suspeitos da autoria do crime.
Na sentença do exame de corpo de delito, foi requerida a intimação de cinco a oito testemunhas. Nesse ínterim, foram presos os escravizados Francisco e Salvador. Foi alegado que Francisco havia confessado a autoria do crime; e Salvador foi preso por conivência, e também por parte do dinheiro roubado ter sido encontrada em sua possessão.
O processo então prosseguiu ao auto de qualificação, onde foram feitas perguntas aos réus. Francisco alegou ser um escravizado de nação, mas não sabia de qual nação era oriundo. Salvador, por sua vez, alegou ser “crioulo”, natural da vila de São Francisco (atual município de São Francisco do Sul, Santa Catarina). Francisco tinha 16 anos de idade, e Salvador não sabia dizer quantos anos tinha.
Foram ouvidas as testemunhas; todas disseram saber por ouvir falar que os autores do crime foram os escravizados ali presentes. Novamente, os réus foram interrogados, dessa vez sendo perguntados sobre detalhes do fato criminoso e provas que atestassem sua inocência. Francisco não disse nada em sua defesa; Salvador, porém, alegou que quando chegou à casa do doutor Hermogenes, a porta já estava arrombada e os roubos já tinham sido cometidos. Justificou a sua posse das moedas dizendo que elas lhe foram entregues por Francisco, que pediu a Salvador para que as guardasse.
Porém, o promotor público João Francisco de Souza apontou uma série de irregularidades no processo. Desde erros específicos no rito processual, como a falta de menção formal a portarias e notificações do processo, até irregularidades no procedimento, como ocorrido na inquirição da vítima durante o exame de corpo de delito e, também, na falta de intimação de certas testemunhas. Além disso, o promotor afirmou que tanto o depoimento de algumas testemunhas quanto dos escravizados eram inverossímeis.
Os réus escravizados Francisco e Salvador, que se achavam presos, receberam alvará de soltura em 21 de abril de 1858, em razão do péssimo estado de saúde de ambos. Os réus foram despronunciados do crime; porém, em 4 de janeiro de 1865, o promotor público moveu um recurso para pronunciá-los novamente. Ao final do recurso, por sentença, os réus foram pronunciados incursos no crime de roubo. Foram, então, lançados no rol dos culpados, e o juiz mandou passar mandado de prisão contra os dois escravizados.
Atuaram no processo:
coletor de rendas gerais e procurador major Antonio Saturnino de Souza e Oliveira;
escrivão Constancio Xavier de Souza;
escrivão interino Generoso Pereira dos Anjos;
escrivão substituto da subdelegacia Martinho José da Silva;
juiz corregedor Joaquim José Henriques;
juiz municipal José Marcelino Alves de Sá;
juiz municipal segundo suplente Laurentino José da Costa;
juiz de paz e delegado de polícia José Joaquim da Cunha Passos;
oficial de justiça Caciano José Ferreira;
oficial de justiça Gregorio Antonio;
perito Antonio Rodrigues Lima;
perito Leandro Bento Correia;
promotor público Francisco Honorato Cidade;
promotor público interino João Francisco de Souza;
signatário Domingos Leite.
Localidades relevantes:
vila de Lages (atual município em Santa Catarina);
vila de São Francisco (atual município de São Francisco do Sul, Santa Catarina);
comarca de São José.
Compõem o processo:
auto de exame e corpo de delito;
auto de qualificação;
contas;
correição;
denúncia;
mandado de intimação;
mandado de prisão;
recurso crime;
sentenças;
termo de juramento de curador;
termo de juramento de peritos;
termo de recurso;
testemunhos;
traslado de peças do sumário crime.
Variações de nome:
juiz municipal José Marcellino Alves de Sá;
perito Leandro Bento Corrêa;
vila de Sam Francisco;
comarca de Sam José.